quarta-feira, 24 de abril de 2019

Sobre o sentir

Sinto tanto,
sinto muito.

E o que fazer com tanto sentir?

Anestesiar?
Deixar fluir?
Tentar entender?
Não permitir?

Sinto tanto,
sinto muito.

É que só sei ser assim.
Mas disfarço, me contenho
pra que doa só em mim.
 


segunda-feira, 22 de abril de 2019

Páscoa, pessach

Renascimento, libertação

Sobre o dançar

Sozinha o dia inteiro que já findava, dancei exaustivamente as mais dramáticas músicas como se praticasse um auto exorcismo. E durante umas leituras noturnas, me vieram centelhas do porque que eu danço.
Anteontem mesmo, mami comentou ao ver um balé na tv: sua irmã sempre gostou de teatro, mas você sempre preferiu dança. É verdade. Ainda hoje me lembro e reproduzo os passinhos frenéticos do foxtrot, meu ritmo preferido da dança de salão, minha primeira e breve experiência aos 12 anos, ocasionada pela recusa do treinador de que eu participasse do time de futsal por ser menina. Adolescente e com mania de Egito antigo fui atrás da dança do ventre. Mas foi já na universidade que me encontrei na dança de verdade. A dança moderna me ensinou sobre um corpo forte e flexível. O oposto da delicadeza frágil do balé clássico, deveríamos expressar toda a nossa potência - pisadas firmes, movimentos duros e precisos, marcados feito compasso e esquadro. Abdome, pernas e braços que se expandiam e jorravam energia, como se deles partissem feixes de luz. Depois, com a dança contemporânea, meu corpo já sabia mover, mas o desafio maior foi a liberdade dada pra criar o movimento. Foi proposta uma coreografia onde tínhamos que desenvolver um solo que evocasse nossas repulsas e medos, nossas loucuras secretas, para apresentar num espetáculo. Na minha, eu levava as mãos aos ouvidos, para silenciar as vozes do pensamento que não me deixavam sossegar. Num trecho da coreografia, todas as integrantes deveriam, uma por uma, ir à beira do palco e gritar do modo mais estridente possível. Mas meu grito foi mudo - abri a boca de onde só escapou o silêncio. Por isso a tentativa da adolescência num grupo de teatro foi falha. O problema, desde cedo, é falar. E acho que de tanto calar, meu corpo se especializou em tentar dizer tudo aquilo que estava indizível - dançando, ou por vias mais dolorosas (quando fica incontrolável - os espasmos, tremores, palpitações...). E assim, também se aperfeiçoa o buscar e sentir: cada olhar, cada mínimo toque, se reveste de poderosa intensidade.
*Ah, já quase esquecia. A coreografia foi montada e nos apresentamos duas vezes num teatro pequeno. O nome do espetáculo: Histeria.

**Será que algum dia tu ainda me verás dançar?

sexta-feira, 5 de abril de 2019

à luz da luz que parte

À luz da luz que parte
Vemos melhor, de facto,
Que à do pavio que fica.
Há algo na partida
Que a visão clarifica
E os raios aviva.
Emily Dickinson

quinta-feira, 4 de abril de 2019

Luto

Eu senti como se alguém tivesse morrido
Mas quem morreu ?
Eu mesma. Eu morri
Escolhi morrer
E o pior, uma morte tão prematura
Dois anos e meio,
Mal tinha aprendido a andar e falar
Parti
Ninguém me ouviu cantar
Ninguém me viu chorar
E velei o meu próprio luto