sábado, 17 de novembro de 2018

sede II

eu abri a porta
da minha casa
pra te dar água
pra curar tua sede
mas eu sabia
e tu sabia
que não era só isso
que a gente queria

naquele dia tão quente
sol fervente
e meu corpo a desejar
você apareceu de repente
tão carente
que deixei você entrar
...
pela porta da minha casa
pelos segredos do meu corpo
em um rodopio louco
...
eu já pressentia
ao andar pela cidade
teu olhar que me seguia
onde quer que eu fosse andar
e onde tu tava eu ia
enganando a realidade
mas tentava disfarçar

sede

"traga-me um copo d'água eu tenho sede"
mas só com a água ela não irá cessar
traga-me um copo d'água e venha junto
que no teu corpo eu quero me fartar

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Cardiosurrealismo

Arranquei meu coração fora
Não dava mais não...
Arremessei na calçada empoeirada
Depois a velha o varreu,
foi embolando pra pista junto com o lixo
Os carros passavam e o estraçalhavam
Deixando toda a cidade com um rastro
vermelho de mim.


quinta-feira, 5 de julho de 2018

O guardião

Eu estava caminhando no interior de uma igreja medieval de pesadas paredes de pedra aparente.
Fui em direção à saída, mas a grande porta de madeira estava fechada e em sua frente lá estava ele: Alto e forte, de cavanhaque, trajando calça preta, sapatos pretos lustrosos, sem camisa, mas com uma enorme capa preta e vermelha, presa ao pescoço por uma corrente dourada. Diminuí o passo e ele perguntou, malicioso: -Adivinha quem eu sou? Olhei rapidamente e vi em sua mão a enorme chave da igreja, e exclamei: -Ah, você é Exu Tranca Rua! E ele abriu um grande sorriso em resposta.
E então, seguimos conversando sobre seu importante ofício.

domingo, 1 de abril de 2018

Debaixo dos caracóis

E de repente ficamos encurralados
naquele espaço estreito e quente
frente à frente
E você se aproximou ainda mais de meu rosto
-centímetros
E minha respiração acelerando
Puxei teu rosto pros meus ombros
Acariciei os teus cachos
desci para tuas costas desnudas
E corri minhas mãos longamente
Enquanto descasava em teu pescoço

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

O novelo

Há um novelo de lã enganchado na minha garganta
Por isso, acordo de madrugada
Por isso tusso, sufoco, rouca
E minha voz, fraca

Preciso arrancá-lo
Puxar lentamente
a ponta do fio pela boca
suportando a dor arranhar
Ou tudo de uma vez escarrar
numa tosse violenta